terça-feira, 30 de março de 2010

restinga




Que neste verão nos consuma
o azul claro celeste cobalto índigo
turquesa ciano marinho,
todos unidos em uma
grande esssssssssssssssspuma.

sexta-feira, 26 de março de 2010

fragmentos da selva de pedras

Sentada no banco morno de cimento,
ela escreve.
Fim de tarde, o sol baixinho,
filtro laranja no olhar.
O carrinho de bebê, a água de coco,
a brisa bem vinda afasta o cabelo do rosto.
Quando as palavras acabam,
contorna com o lápis a sombra do próprio perfil.
Ao redor, um cachorro descobre a praça pela milésima vez
e, em seguida pela última, a menina.

-

Com o equilíbrio que só aqueles que ainda estão aprendendo a andar possuem, o menino vêm, rápido, como quem tenta alcançar o próprio braço esticado a sua frente. A pequena e roliça seta que ele chama de fura bolo aponta acusatória para a sua fantástica descoberta. O sorriso de dentes de leite sustenta a excitação enquanto ele procura dentro de si o nome para aquilo que vê.
No seu encalce o ímpeto materno, com seus longos braços protetores, o impede de avançar. Preso nas garras da autoridade ele protesta:
- “Cassôrro!” , acusa o menino. “Cassôrro!”
O réu, por sua vez, permanece impassível. Encara o acusador com um mínimo de curiosidade, não o despreza completamente porque desprezo é uma expressão felina, não cabe aos cães. Mas os cães, como coisa viva que são, também possuem suas idiossincrasias e talvez fosse a indiferença uma característica própria do animal em questão.
Há quem diga que o cachorro é sempre um reflexo do dono e neste caso, a regra não mostra exceção. Não muito distante da cena, sentado de frente para a mesinha de jogos - essas de cimento que tem o tabuleiro esculpido na superfície, habitat natural dos aposentados da cidade, o homem contempla a criança sem muito interesse. Alheio, não poderia ter muito mais do que uns trinta anos, a julgar pelos cabelos cheios e os músculos ainda rígidos, nem parecia se importar com qualquer coisa. Ao seu lado, o amigo ainda se mantinha sentado, sem coleira, como quem espera o que vem a seguir.
Esperou em vão, o a seguir não veio. Pelo menos não para o cão. À sua frente, o menino apenas sorriu, mostrando as gengivas dessa vez. Se deixando levar pela mãe, ele recuou deixando sua arma pender apontada para o chão.
Contente consigo mesmo, ele fez a curva escoltado pela redoma humana que ainda o cercava. A praça era o mundo e ele ainda tinha muito a descobrir.


-

A praça sussurra, lentamente,
a conversa dos mais velhos.
Entre um latido e outro as
crianças brincam, gargalham.
Ao fundo, a constante da cigarra
avisa a chuva de verão.
O ruído nas folhas é a brisa
suave que carrega o barulho
da praça pra dentro da gente.