sexta-feira, 30 de julho de 2010

Rua Agostinho Menezes

A minha primeira casa
era feita de mãe, de vó, de bisa,
quatro gatos gordos
e tudo que a gente não jogava fora
em uma rua que fechava
aos domingos na Tijuca.
Nos fundos
dava pra ver o sol nascer
pra mais tarde virar lua
na janela da sala.
Os móveis eram antigos
os quartos amplos
cheios de nostalgia
e pelo.
O relógio de parede
estava sempre atrasado.
Os livros na estante,
empoeirados.
Na mesa,
ninguém comia
mas a música era sempre alta
e ninguém reclamava.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

.


pequenino ponto
pulsante
que pontua
o rítimo
da tua
minha
carne nua
reverberando ondas
espasmos
irrigando escarlate
por toda parte

quinta-feira, 8 de julho de 2010

memória

"Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória."
Carlos Drummond de Andrade.



Lembro de minha avó
sempre almíscar
e sua casa
de incenso e sândalo
em Botafogo.
Lembro de respirar
jabuticaba em novembro
dama-da-noite
quando anoitecia
e a maresia
na praia do Leblon.
Lembro de minha mãe
lençóis quarados
perfume de amaciante.
Era um cheiro confortável.

Talvez cheiro seja coisa da infância
e não exista na vida real.
Talvez cheiro seja lembrança.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

vaga lembrança


Ontem à noite,
a lembrança do belo
me escorregou pela pestana.
Um Botticelli
equilibrando-se no vazio,
lia
rente a porta
do vagão do metrô.
De sua cabeça andrógena
pendiam cachos,
línguas de fogo
que lambiam
as páginas
ruivas de combustão.
Vestido de éter
ele viajava de pé
camisa e calça
monocromáticos
em um tom
de nada.
Lembro
de cada botão
mas quando saltou
não li a estação.